Encontro Nacional

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quarta-feira, 9 de abril de 2014

Maior parte de mim

Vivemos em um mundo que pode ser extremamente estimulante, podendo nos orientar nas mais variadas direções. Muitos de nós têm televisores em suas cozinhas e logo que acordamos já podemos ser levados a viver em São Paulo, Rio de Janeiro, sem sequer ter tomado café. Saindo de casa ligamos o cd do carro e acabamos nos deslocando ao tempo de nossa juventude, ouvindo músicas de quando íamos para a discoteca. Se preferirmos ouvir alguma rádio podemos nos surpreender longe, pensando em como será a eleição deste ano ou a copa do mundo. Numa conversa desinteressada com meu colega de trabalho posso viajar para os Estados Unidos e reviver minha última visita ao lugar, lembrar inclusive o desejo de voltar.  
Todos estes movimentos têm algo em comum: são movimentos que faço sem sair do lugar, são movimentos que se processam unicamente na minha mente. Esta capacidade de poder viajar sem sair do lugar que parece muito interessante, em muitos casos é um grande problema. É o caso das pessoas que se perdem do próprio corpo ao longo de sua história ou em casos episódicos. Alguns relatos peculiares mostram quando isso acontece: são exemplos os casos em que a pessoa toma banho e ao final não se lembra se lavou o cabelo ou passou hidratante. Semelhante é o caso das pessoas que saem de carro, seguem para algum lugar e ao chegar não se lembram do caminho. Nestes casos o corpo era a menor parte da pessoa, era apenas um veículo para a mente.
Quando a mente é a maior parte alguns fenômenos podem ser tornar comuns, como por exemplo, estar sempre acelerado. Imagine que você está tomando banho, logo que acordou, mas não sente o banho, na verdade já está indo para o trabalho, pensando no trânsito, na chegada ao trabalho e naquela conversa com o gestor. Outro fenômeno ainda é perda de medidas, pois o pensamento pode rapidamente se deslocar, seu corpo nem tanto. Por exemplo, quando você está a 140 km/h e ainda se percebe lento. Pode por vezes perder a medida dos alimentos, pois como não sente o gosto ou se sacia come em demasia, com muito tempero. Em outros casos ainda a pessoa perde a noção do tempo, ou seja, fica alguns minutos em algum lugar e tem a impressão de ter passado horas, assim como pode ter ficado muito tempo e achar que se passaram alguns minutos.
O retorno ao corpo pode ser feito de diversas formas e em cada um acontece de maneira diferente. Algumas pessoas somente conseguem retornar ao corpo quando entram em contato com a natureza, são aquelas que precisam de um final de semana no sítio, cercados de mata, pássaros, sons da natureza. Outras pessoas precisam fazer um curso de degustação de vinhos, onde o foco sensorial é extremamente necessário. São vários os casos em que a pessoa para fazer o retorno ao próprio corpo precisa fazer um curso de culinária, cheirar os temperos, sentir o gosto dos molhos. Outra sugestão são trabalhos manuais;várias pessoas voltam ao corpo quando fazem trabalhos com argila, escultura, pintura, origami. Voltar ao corpo é vivê-lo à sua maneira, não há duas experiências de vida de corporeidade iguais, meu corpo é vivido do meu jeito.
Tornar meu corpo a maior parte de mim faz com que seja possível viver os prazeres do corpo de modo completo e não apenas protocolar. Tomar um bom vinho se faz com os sentidos e não com o pensamento, vinho bebido com o pensamento não tem gosto, tem reflexão. Viver o corpo pode nos libertar dos nossos próprios pensamentos.

Rosemiro A. Sefstrom

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